A gente assistia “Friends with benefits” dublado na sala de estar da
casa dela quando, natural e subitamente, rolou o primeiro beijo. Foi meio que
impulsionado por alguma força externa, eu acho (o álcool, talvez). Posso
afirmar que não tomei a iniciativa e ela jurou de pés juntos que também não.
Sabe quando parece que rola um magnetismo corporal involuntário, onde os corpos
se atraem tão lentamente que se fundem quase que em um só por alguns segundos?
Entendem isso? É muito louco! Todo mundo já viveu alguma coisa assim. Vale a
pena, mas aconselho aqui (inclusive a mim mesmo), com conhecimento de caso, que
quando as coisas começam desse jeito, é melhor preparar o coração.
Éramos amigos de longa data. Amigos de infância mesmo. Brincamos juntos,
nossos pais se conheciam, etc. Tipo aquele lance de quase primos. Não tínhamos
nenhum parentesco real mas era como se tivéssemos. ‘Bibi’ pra cá – ‘Seu Chato’
pra lá. Essas nomenclaturas infantis clássicas que te fazem perder todo tesão
que você pudesse ter naquela menina que cresceu contigo, ainda que ela seja uma
versão beta da Penelope Cruz. Bom, mas o tempo passa, as coisas mudam, e lá estávamos
nós, mais de 20 anos depois, abraçados na cama, olhando pro teto daquele quarto
escuro e pensando em silêncio simultaneamente: “Caralho, o mundo dá muitas
voltas!”.
Pois é verdade. Eu sou daqueles que acredita que algumas coisas na vida
tem de acontecer sim ou sim. Essa por exemplo, foi uma delas. Tá, tudo bem,
sejamos sinceros. Naquela noite meio fria de sábado eu joguei baixo (mas juro
que não tinha a pretensão de ir tão longe). Os pais dela tinham viajado pro
interior e ela ficaria em casa todo o fim de semana sozinha. Eu ofereci
companhia e toquei a campainha às 22:30h com um vinho tinto francês e cheio de
sorrisos. Fazia bastante tempo que a gente não se via. Tinha muita conversa pra
pôr em dia, afinal. Abrimos a garrafa e entre um gole e outro, uma série no
netflix e uma gargalhada alta entramos em um clima tão gostoso que a partir
dali tudo podia acontecer.
Quando a garrafa acabou eu me dei conta de que a Bia já tava rindo à toa.
Honestamente eu também não me sentia absolutamente sóbrio. Escolhemos outro
filme (o tal lá da primeira linha) e deitamos no sofá. Não demorou muito pra
que nossos corpos se aproximassem à uma linha tênue extremamente perigosa entre
a amizade e o libido. Senti medo de avançar, e não o fiz. Me contive
contrariando aos meus instintos mais latentes, se é que me entendem. Relaxei.
Quase me mexi pra distanciar meu peito das costas dela, mas eu não queria deixar
de sentir aquele perfume. Fui fraco. Fiquei, e foi o suficiente. Dois minutos
depois e já nos beijávamos como se fossemos velhos amantes. Parecia estranho e
estúpido, mas tava tão bom que não conseguimos parar; e aquilo foi só o início
da noite.
A gente se encaixava bem na cama. Os olhares se cruzavam cheios de
mensagens subliminares. As mãos deslizavam por caminhos óbvios, mas descobriam
prazeres inéditos. As roupas já não existiam mais. Na verdade, muita coisa ali
a nossa volta já não existia; pra nós, naquele momento não importava. A magia
que emanava dentro daquelas quatro paredes transcendia o modo de percepção
empírica do ato. Era especial. Fora do comum.
Hoje eu to aqui, na poltrona do meu quarto, escrevendo umas coisas e
pensando nesse lance que tá acontecendo com a gente. Me lembro que há alguns
anos atrás eu já tinha essa vontade de me aproximar pra ver se rolava alguma
coisa, mas ela namorava. Era complicado. Agora vejo o caminho aberto, e as
coisas acontecendo tão naturalmente que me assustam um pouco. Não achei que
seria assim. Na verdade, eu também não sei como achei que seria. Vocês entendem
né, eu só não queria me apaixonar. O problema é que essas coisas não se
escolhe; e é exatamente isso o que me preocupa. Naquela noite a gente não
assistiu ao final do filme, óbvio, mas não precisa ser muito esperto pra
entender a lógica romantizada dessas baboseiras hollywoodianas: Em pouco tempo
o casal perde o controle da situação inicial e passa a integrar as estatísticas
das relações estáveis e socialmente aceitas.
Dizem que a vida imita a arte! Vamo ver no que dá...
Matheus Fonseca Pinheiro
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