sábado, 22 de setembro de 2012

Luta ou Fuga ?



Tarde, outono, 2003. A garota caminhava na calçada. Rua deserta, era quarta. Burburinhos de crianças brincando, ouvia-se ao longe. Janelas abertas. Senhoras recolhiam roupas na corda. Ela passava cabeça baixa, como quem não quer enxergar o que vem pela frente. Levava nas mãos um livro. No rosto, maquiagem e apatia. O silêncio não a comovia e ela apenas caminhava, sempre a passos largos. Até que ao cruzamento, parou para atravessar.

Levantou os olhos e avistou a igreja. Capela simples, século passado. Entrou e ajoelhou-se no último banco, como quem não tem muita intimidade com o ambiente. Não reparou sequer o interior do lugar. Baixou a cabeça encostando o queixo no peito e apertou firme, com as duas mãos, o livro contra o tórax. Balbuciava palavras rápidas como se tivesse pressa, ou angústia acumulada. Fez cara de choro, mas conteve-se. Minutos depois, levantou.

Só na saída ergueu os olhos ao cristo crucificado no fundo da capela. Foi em frente ao altar, fez reverência e o sinal da cruz, saindo pela porta lateral. Desceu a ladeira acompanhando a calçada. Parecia estar convicta em seu objetivo. Parecia saber bem aonde ia. Aos poucos foi descendo o gramado do parque da cidade. Corria em direção ao lago. O vento sacudia o vestido. Sentou a beira da água. Eram 17:45, estava sozinha. Abriu o livro e começou a escrever.

Não era propriamente um livro, mas um diário. Haviam muitas páginas escritas. Muito provavelmente, era ela, a protagonista das histórias retratadas ao longo daquelas tantas linhas. Seria esse seu costume? Sair de casa a tarde, ir à igreja rezar e depois escrever às margens do lago do parque? Ou seria esse o motivo de sua fuga?

Acabou de escrever e segurou o manuscrito com a ponta dos dedos colocando-o entre a grama e a sua cabeça, como travesseiro (...) Fechou os olhos e adormeceu sobre a relva, às margens do pequenino lago azul.

Matheus Fonseca Pinheiro

Nenhum comentário:

Postar um comentário